Jovens com deficiência intelectual, síndrome de Down e autismo leve têm conquistado espaço profissional em novas cantinas e pizzarias italianas, que tentam expandir sua contratação para todo o país.
Muitos desses restaurantes são criados por associações e cooperativas, já incorporando a mão de obra de jovens com deficiência que passaram por cursos de especialização.
Só na Locanda dei Girasoli, em Roma, 15 funcionários com necessidades especiais trabalham na cozinha, servindo às mesas ou na fabricação de doces.
Graças ao sucesso da experiência, os responsáveis estão abrindo outras filiais do restaurante, uma delas em Palermo, na Sicília, e pensam em transformar a ideia numa franquia.
“Recebemos diversos pedidos de consultoria por parte de associações e restaurantes interessados em adotar o nosso modelo. Estamos criando um protocolo com ajuda de especialistas de diferentes setores, porque não se trata de um sistema para atrair clientes ou para fazer assistencialismo”, disse à BBC Brasil o presidente da Cooperativa Social Sintese, responsável pela gestão do local, Enzo Rimicci.
“É muito importante evitar especulações. Nosso objetivo é o acesso efetivo desses jovens ao mercado de trabalho”, afirmou.
No restaurante, os funcionários portadores de deficiência têm o mesmo tratamento previsto aos trabalhadores da categoria. “São todos remunerados, inclusive os estagiários. Assim como os demais, eles também recebem treinamento e têm horário de trabalho e funções específicas”, disse Rimicci.
Como em qualquer atividade comercial, os empregados passam por um processo de seleção. “O trabalho em restaurantes requer agilidade. É preciso dizer sem rodeios que são pessoas com deficiências cognitivas e que nem todas são aptas a realizar este tipo de atividade”, explica.
“Os que não superam o período de prova certamente poderão realizar um outro trabalho. Há sempre uma oportunidade para todos”.
Boa comida e integração social:
Para o ajudante de cozinha Emanuele Raffaele, jovem de 24 anos com síndrome de Down, o segredo da boa cozinha é o cuidado com os ingredientes.
“Para preparar algo bom é necessário lavar bem as hortaliças e verduras, saber cortar as partes duras ou eliminar as folhas ruins”. Para ele, poder trabalhar na cozinha é uma conquista e o próximo passo é aprender a preparar peixes. “Vejo tudo com os olhos, depois memorizo e repito tudo o que o chef faz”, disse à BBC Brasil.
Segundo a mãe de Emanuele, Antonella Marrazzi, o trabalho no restaurante tem ajudado o filho a amadurecer. “Vejo que a cada dia ele adquire mais segurança no modo de relacionar-se com os colegas e com os chefes no seu trabalho. Hoje ele se sente importante”, disse.
Entre os funcionários especiais, a mais antiga da casa é Viviana Ponzelli, garçonete de 39 anos e portadora de Down, que trabalha no local há oito anos. “Preparo a mesa e sirvo os clientes. Estou bem aqui”, contou.
“Se os clientes vissem que os portadores de deficiência estão no nosso restaurante sem fazer nada, pensariam que estão fazendo beneficência. Não é o nosso caso. As pessoas vêm ao nosso local porque come-se bem e porque há jovens com algumas dificuldades fazendo o próprio trabalho”, afirma o responsável pelo restaurante.
Em toda Itália:
Outro local em Roma a empregar pessoas com deficiências intelectuais é a Trattoria degli Amici, localizado no bairro de Trastevere. Em Florença o restaurante I ragazzi del Sipario abre apenas para almoço, enquanto em Milão o serviço de catering do Laboratório Procaccini Quattordici deve ser reservado com muita antecedência.
Em Modena, o La Lanterna di Diogene emprega jovens com síndrome de Down inclusive na própria horta.
Aberto em Turim em 2008, o Caffè Basaglia também conta com funcionários especiais. O nome é uma homenagem ao psiquiatra Franco Basaglia, responsável pela lei de 1978 que aboliu os manicômios na Itália em favor da criação de redes de serviços territoriais de assistência às pessoas com distúrbio mentais.