Tudo mudou na vida de Patrícia Moreira desde que fora flagrada por câmeras de televisão proferindo injúrias raciais contra o goleiro Aranha, em 28 de agosto, na Arena. Inclusive, uma das tarefas que tinha como mais rotineira, a de acompanhar os jogos do Grêmio. Enquanto aguarda o desfecho do inquérito em que é investigada pela Polícia Civil, a torcedora de 23 anos não assiste mais às partidas do clube. E assim será nesta quinta, quando Aranha e o Santos voltarão ao palco do incidente que sacudiu o esporte brasileiro há 20 dias.
De acordo com o advogado Alexandre Rossato, Patrícia está “traumatizada” com o futebol. Por isso, preferiu deixar de lado as partidas também pela TV, já que está proibida de frequentar a Arena – teve a matrícula de sócia suspensa pelo Grêmio assim que fora oficialmente identificada. O máximo a que Patrícia se permite, diz Rossato, é pedir por informações objetivas sobre o time, se ganhou, se perdeu e em que colocação está na tabela do Brasileirão.
O mesmo isolamento vale sobre Aranha. O goleiro alvo das injúrias de Patrícia e outros torcedores, embora relutante, chegou a perdoar a jovem. No entanto, descartou um encontro entre eles, uma sugestão antes dada por Patrícia. Embora pudesse aproveitar a passagem de Aranha por Porto Alegre nesta semana, a garota não planeja uma nova investida.
– Ela está traumatizada com o que aconteceu, com o mundo do futebol, quer distância disso tudo. Não viu os jogos desde então e muito menos verá o jogo contra o Santos. O mesmo vale para o Aranha. Não há por que insistir. Cabe a ela respeitar a decisão do jogador, de não querer encontrá-la – explica o advogado Alexandre Rossato.
As consultas a jornais e sites foram refutadas por Patrícia. A ideia é evitar ao máximo relembrar o episódio no qual se transformou em protagonista ao ser identificada pela câmeras gritando “macaco” contra o goleiro santista. Desde então, a torcedora teve a vida alterada. Deixou de morar em sua residência, na Zona Norte de Porto Alegre, e agora se reveza em casas de familiares e amigos.
As poucas vezes em que saiu de suas moradias momentâneas foi para conceder entrevistas. Para tanto, montou-se um esquema especial. Segundo Rossato, já foram usados dois seguranças e carros diferentes em cada trajeto, dependendo das circunstâncias. As trocas de residências costumam ser igualmente discretas, realizadas no início da madrugada. Os vizinhos desconhecem sua estadia.
Por falar em vizinhos, a maioria deles em seu antigo bairro nutrem rejeição. Patrícia até pensou em voltar aos poucos para o Passo das Pedras, mas acabou completamente demovida da intenção ao ter, na sexta-feira, parte de sua casa incendiada. O suspeito foi preso e confessou o ato. Será indiciado por crime de incêndio. O imóvel, que pertence a sua família e fora apedrejado semanas atrás, será alugado.
Na manhã seguinte ao episódio de injúrias raciais, Patrícia foi afastada do trabalho no Centro Médico Odontológico da Brigada Militar, em Porto Alegre. Desde então, também não voltou a trabalhar. Faz tratamento psiquiátrico domiciliar. O médico a visita e receita remédios com efeito calmante. Patrícia tem dificuldades de dormir.
– No momento, ela está vivendo em outro mundo – resume o advogado, que recebe cerca de 30 telefonemas diários de jornalistas que procuram informações da cliente.
Antes de entrevistas para determinados programas e veículos de comunicação, Patrícia havia aparecido em público duas vezes nos últimos 20 dias. Primeiro, uma semana após o episódio na Arena, em 4 de setembro, para prestar depoimento em delegacia de Porto Alegre. Chegou ao local com o rosto escondido das câmeras. Falou sobre o caso no dia seguinte, em encontro com jornalistas, no qual foram proibidos questionamentos. O pronunciamento não durou cinco minutos.
Nele, negou ser racista e desculpou-se com Aranha e com o próprio Grêmio, que acabou excluído da Copa do Brasil pelas injúrias raciais. O clube ainda será julgado em segunda instância, pelo Pleno do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), em data a ser oficializada.