Angele Grenier, uma canadense de meia idade, não tem o perfil típico de uma criminosa, mas autoridades do Canadá querem vê-la atrás das grades.
Angele é investigada por contrabando. Mas o que exatamente ela negociava? Drogas? Armas?
Nada disso. A canadense vendia “maple syrup” (xarope de ácer ou xarope de bordo), um líquido adocicado muito consumido nos Estados Unidos e no Canadá durante o café da manhã.Durante décadas, Angele e seu marido produziram xarope de bordo em sua fazenda no vilarejo de Sainte-Clotilde-de-Beauce, localizado a 100 km ao sul da cidade de Québec.
A cada primavera, o casal furava as árvores e colhia a seiva doce que brotava delas, matéria-prima do produto. O líquido viscoso é então fervido para produzir o xarope. Tudo sem conservantes.
Trata-se de uma prática comum por todo o Québec, cujos 7,3 mil produtores de xarope de bordo ─ muitos das quais fazendas de controle familiar ─ respondem por 70% da oferta global, um negócio estimado em 600 milhões de dólares canadenses (R$ 1,7 bilhão).
O problema é que Angele e outros “rebeldes”, como são conhecidos, não podem vender o xarope livremente.
Em vez disso, desde 1990, eles são obrigados a entregar a maior parte de sua produção à Federação de Produtores de Xarope de Bordo do Québec (conhecida pela sigla FPAQ).
Apoiado por decisões da Justiça, a FPAQ detém o monopólio de venda do xarope de bordo produzido na província, incluindo a exportação do produto. A entidade também determina o preço que paga aos produtores, além de cobrar uma taxa de 12% sobre as vendas que excederem 500 ml do xarope.
Por causa disso, produtores só têm permissão de vender de forma independente uma pequena quantidade do produto, a pessoas que visitam as fazendas ou aos mercados locais. Mesmo assim, também têm de pagar comissão à FPAQ.
As medidas são alvo de críticas de produtores, como Angele.
“Não somos donos do nosso próprio xarope”, diz Angele, que chama a federação de “máfia”.
Para contornar a proibição, nos últimos anos, Angele e seu marido vêm vendendo o xarope na fronteira com a província vizinha de New Brunswick.
No que parece ser um filme de Hollywood, eles carregam os tonéis de xarope em um caminhão o mais rápido possível, e então partem para a fronteira na calada da noite.
O casal está infringindo a lei, mas dizem estar lutando pelo direito de vender seu xarope pelo preço ─ e para clientes ─ de sua própria escolha.
Desde então, funcionários da FPAQ e policiais já foram à casa de Angele várias vezes, e ela pode ser presa se continuar a se recusar a entregar sua produção.
A entidade também a multou em 500 mil dólares canadenses (R$ 1,4 milhão). Angele recorreu da decisão na Justiça e diz que não vai recuar.
“Queremos a nossa liberdade de volta”, diz Angele.