Um patrimônio natural do Brasil agoniza em meio a uma onda devastadora de incêndios. Quem vai salvar o Pantanal? As chamas já consumiram 20% da vegetação. Animais em desespero tentam escapar do fogo, que se espalha com rapidez no clima seco. A região enfrenta a maior estiagem dos últimos 50 anos, consequência do aquecimento global.
Mas, a exemplo do que acontece na Amazônia, as queimadas no Pantanal podem ser resultado principalmente da intervenção humana. É o que uma investigação da Polícia Federal busca descobrir e o Fantástico teve acesso com exclusividade às informações do inquérito. Com a ajuda de imagens de satélite, os agentes identificaram o início de alguns focos de incêndios. A principal suspeita é de que, nos casos investigados, a ação tenha sido criminosa.
Em uma das regiões mais preservadas da região, perto do Parque Nacional do Pantanal, na divisa entre Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, o fogo teria começado de forma criminosa, dentro de fazendas.
“A Polícia Federal tem por competência constitucional e atribuição apuração de danos ambientais que atinjam áreas de proteção da União”, destaca Leonardo Rafaini, delegado da Polícia Federal. O nome dessa operação é “Matáá”, que significa fogo no idioma de uma tribo indígena do Pantanal.
A investigação começou com a análise de imagens de satélites da Nasa. Um dos exemplos: no dia 30 de junho, aparece um primeiro foco de incêndio em uma fazenda. “A única causa natural para os incêndios florestais são as descargas elétricas atmosféricas, os raios”, afirma Alexandre Martins Pereira – analista ambiental do Prevfogo-Ibama. Em 30 de junho, não houve raios e o incêndio só pode ter sido provocado pelo homem. No dia seguinte, surgem outros focos, inclusive na fazenda vizinha. O incêndio cresce muito, como mostram as imagens. Situação parecida se repetiu em outras duas fazendas. E os focos começaram em datas próximas, no mês de julho – o que chamou ainda mais a atenção dos policiais.
No caso das quatro fazendas do Pantanal, o passo seguinte da investigação foi checar se as informações da Nasa batiam com as do banco de dados do Inpe, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. “É possível identificar a origem, o local dos focos e onde houve o provável início dos incêndios”, diz o delegado.
O resultado do Inpe: as queimadas começaram mesmo dentro das quatro fazendas e se espalharam, reforçando a suspeita de incêndio proposital. Depois, policiais seguiram as coordenadas dos satélites, filmaram – e fotografaram – o que sobrou do incêndio nas fazendas. Segundo a Polícia Federal, a devastação passou dos limites das fazendas e atingiu uma área total de cerca de 33 mil hectares, incluindo áreas de preservação permanente. A principal suspeita é que, nesse caso, houve o uso indevido do fogo para limpeza das pastagens.
Esse ano, já queimaram quase 3 milhões de hectares no Pantanal. E muitos focos começam por causa de uma prática comum, nem sempre autorizada pelos órgãos ambientais: atear fogo na pastagem para renovar o pasto. Depois da queima, com a primeira chuva, o capim rebrota vigoroso para engordar o gado. O problema é que com a seca e o vento, as chamas se alastram por fazendas vizinhas, atingem reservas ambientais, matam animais silvestres e devastam a vegetação nativa.
ma das quatro fazendas investigadas pela Polícia Federal se chama Bonsucesso. Ainda havia focos de incêndio quando os agentes sobrevoaram o lugar, no mês passado.
O dono da Bonsucesso é o pecuarista Ivanildo Miranda. Ele é acusado de participar de escândalos recentes em Mato Grosso do Sul e aceitou fazer delação premiada. Ivanildo é réu em um processo de corrupção envolvendo políticos e empresários. O advogado dele, Newley Amarilla, falou sobre a investigação dos incêndios no Pantanal: “O senhor Ivanildo, meu cliente, não ateou fogo, nem mandou atear fogo em lugar nenhum”. O advogado não sabe dizer como o fogo começou: “Queimou cerca de 500 a 700 hectares. Não é possível até agora medir, embora o fogo já tenha sido extinto”.
Esta semana, policiais cumpriram mandados de busca e apreensão nas fazendas. O inquérito ainda está em andamento. A pena pode chegar a mais de 15 anos de prisão por danos ao Pantanal.