Com a ida para o ministério, Lula passa a ter foro privilegiado. Os processos contra ele vão para o Supremo Tribunal Federal, o que significa que, as investigações saem da jurisdição do juiz Sérgio Moro.
Antes de encaminhar o processo ao STF, Moro decidiu pelo fim do sigilo do processo e várias conversas telefônicas do ex-presidente Lula, gravadas pela Polícia Federal foram divulgadas. No despacho publicado nesta quarta-feira (16), Moro disse que “a democracia numa sociedade livre exige que os governados saibam o que fazem os governantes, mesmo quando estes buscam agir protegidos pelas sombras. Isso é ainda mais relevante num cenário de aparentes tentativas de obstrução à Justiça”.
As interceptações telefônicas começaram no dia 19 de fevereiro. No dia 4 de março, logo depois de sair do depoimento à Polícia Federal na Operação Aletheia, Lula falou com a presidente Dilma Rousseff.
“Nós temos uma Suprema Corte totalmente acovardada, nós temos um Superior Tribunal de Justiça totalmente acovardado, um Parlamento totalmente acovardado, somente nos últimos tempos é que o PT e o PC do B é que começaram a acordar e começaram a brigar. Sabe? Nós temos um presidente da Câmara f**, um presidente do Senado f**, não sei quanto parlamentares ameaçados, e fica todo mundo no compasso de que vai acontecer um milagre e que vai todo mundo se salvar”.
Em uma das gravações, de 27 de fevereiro, seis dias antes da condução coercitiva de Lula, o ex-presidente fala com Rui Falcão, presidente do PT. Os investigadores dizem que essa conversa e outras que foram interceptadas indicam que Lula pode ter ficado sabendo da operação contra ele e tentado atrapalhar o trabalho da Lava Jato.
Lula disse: “Eu tô esperando segunda-feira a operação de busca e apreensão na minha casa, do meu filho Marcos, do meu filho Fábio, do meu filho Sandro, do meu filho Claudio, da casa do Paulo Okamotto. Eu vou pensar amanhã se eu convoco alguns deputados para surpreendê-los”.
Segundo os investigadores, nas interceptações autorizadas pelo juiz Sérgio Moro, Lula teria tentado influenciar e conseguir ajuda de autoridades do Ministério Público Federal e até de ministros do Supremo Tribunal Federal.
Em outra conversa gravada em 27 de fevereiro, o ex-presidente fala com Paulo de Tarso Vanucchi, que foi ministro da Secretaria de Direitos Humanos no governo Lula. De acordo com a Polícia Federal, no trecho em que Lula cita o nome “Aragão”, pode ser uma referência ao ministro indicado da Justiça, Eugênio Aragão, que também é sub-procurador geral da República.
Lula disse: “O problema é o seguinte, Paulinho, nós temos que comprar essa briga, eu sei que é difícil, sabe? Eu às vezes fico pensando até que o Aragão deveria cumprir um papel de homem naquela p*, porque o Aragão parece nosso amigo, parece, parece, mas tá sempre dizendo ‘olha'”.
Em conversa com Jaques Wagner, Lula falou também sobre um pedido dos advogados dele, que estava no Supremo Tribunal Federal. O pedido questionava quem deveria investigá-lo, se o Ministério Público de São Paulo ou a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Lula falou: “Eu acho que eles quiseram antecipar o pedido nosso que tá na Suprema Corte, que tá na mão da Rosa Weber”.
Lula depois pede para que o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, converse com Dilma a respeito do “negócio da Rosa Weber”.
Lula falou: “Mas viu, querido, ‘ela’ tá falando dessa reunião, ô Wagner, eu queria que você visse agora, falar com “ela”, já que ‘ela’ tá aí, falar o negócio da Rosa Weber, que tá na mão dela pra decidir. Se homem não tem saco, quem sabe uma mulher corajosa possa fazer o que os homens não fizeram”.
A ministra Rosa Weber negou o pedido da defesa de Lula porque entendeu que não houve ilegalidade nas duas investigações.
Na segunda-feira, dia 14 de março, às 19h, em uma conversa de pouco mais de quatro minutos, o ex-presidente Lula conversa com Jaques Wagner, que chega a oferecer o cargo de ministro-chefe da Casa Civil, para Lula.
Jaques Wagner:Meu cargo está à sua disposição, viu?!
Lula: Tá bom.
Jaques Wagner: Eu posso até ser seu carregador de documento.
Lula: Eu serei, eu serei seu ajudante.
Jaques Wagner: Eu vou ser seu “AJO”.
Lula: Eu serei seu adjunto. (risadas)
Jaques Wagner: Tá bom.
Em outro telefonema, um homem identificado como Roberto Carlos deixa claro que o ministério serve de foro privilegiado para Lula.
Roberto Carlos fala: Eu acho, tá, tem uma coisa que tá na mão de vocês, é ministério, acabou, p*!
Roberto Carlos continua: Agora, você tem uma coisa na tua mão: você, o PT, a Dilma…. vai ter porrada? Vão criticar? E daí? Numa boa, você resolve outro problema, que é o problema da governabilidade. Você e Dilma, um depende do outro, c*!
Lula responde:”Uhumm”.
Em conversa com o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, Lula reclama da investigação da Receita Federal que envolve o Instituto Lula.
Lula: Ô, Nelson, deixa eu te falar uma coisa por telefone, isso daqui. O possível que a Polícia Federal esteja gravando. É preciso acompanhar o que a Receita tá fazendo junto com a Polícia Federal, bicho!
Nelson Barbosa: Não, é… eles fazem parte.
Lula: É, mas você precisa se inteirar do que eles estão fazendo no instituto. Se eles fizessem isso com meia dúzia de grandes empresas, resolvia o problema de arrecadação do Estado.
Nelson Barbosa: “Uhumm”, sei.
Lula: Estão procurando pelo em ovo. Eu acho que era preciso…eu vou pedir pro Paulo Okamotto botar tudo no papel, porque era preciso você chamar o responsável e falar “que p* que é essa?” Vocês estão fazendo o mesmo com a Globo, com o Instituto Fernando Henrique Cardoso, o mesmo com Gerdau, o mesmo com o SBT, o mesmo com a Record?! Ou só com o Lula??!
Nelson Barbosa: Tá, pede pro Paulo colocar.
No dia 7 de março, a Polícia Federal interceptou uma conversa entre o ex-presidente Lula e o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes. O prefeito diz que está sofrendo e Lula rebate, dizendo que ele é abençoado por Deus por causa das Olimpíadas.
Eduardo Paes: Segurar a Olimpíada com Lula e Sérgio Cabral é uma coisa, mas segurar com aquele bom humor da Dilma e do Pezão…
Lula: Nem me fale querido.
Eduardo Paes: Agora, da próxima vez o senhor me para com essa vida de pobre, com essa tua alma de pobre comprando “esse barco de merda”, “sitiozinho vagabundo”, p*. O senhor é uma alma de pobre. Eu, todo mundo que fala aqui no meio, eu falo o seguinte: imagina se fosse aqui no Rio esse sítio dele, não é em Petrópolis, não é em Itaipava. É como se fosse em Maricá. É uma m* de lugar, p*!
Em uma outra gravação do dia 7 de março, Lula conversa com Sigmaringa Seixas, advogado ligado ao PT e ex-deputado. Para os investigadores, Sigmaringa diz que vai fazer uma petição formal e jogar para a imprensa para constranger o procurador-geral da República.
Lula: Eu não sei o quê que eu pedi pra você de manhã, esqueci, mas era uma coisa simples que não precisava de formalidade.
Sigmaringa: Não. Mas, simples, ele vai dizer “não”, ele não vai receber. Eu conversei com gente só.
Lula: É porque ele recusou quatro pedidos de investigação ao Aécio e aceitou a primeira de um bandido do Acre contra mim.
Sigmaringa: Pois é… mas se fizer uma petição…
Lula: Essa é a gratidão…essa é a gratidão dele por ele ser procurador.
Sigmaringa: Pois é. Mas ele se tiver… se a gente formalizar, inclusive, jogando pra imprensa, ele vai ficar constrangido. Se for lá conversar, ele diz não e pronto. Ou não diz, né?
Lula: Então conversa com o Cristiano.
Uma outra conversa de Lula com a presidente Dilma foi gravada no início da tarde de quarta-feira (16), depois do anúncio de que o ex-presidente seria ministro da Casa Civil. A presidente ligou para o celular do assessor de Lula.
Dilma: Lula, deixa eu te falar uma coisa.
Lula: Fala, querida, ahn…
Dilma: Seguinte, eu tô mandando o “Bessias” junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!
Lula: “Uhum”. Tá bom, tá bom.
Dilma: Só isso, você espera aí que ele tá indo aí.
Lula: Tá bom, eu tô aqui, eu fico aguardando.
O advogado do ex-presidente Lula afirmou que a divulgação dos áudios foi uma arbitrariedade e está causando convulsão social.
O advogado do ex-presidente Lula afirmou que a divulgação dos áudios foi uma arbitrariedade e está causando uma convulsão social.
Em relação a divulgação do diálogo entre a presidente Dilma e Lula, o Palácio do Planalto afirmou que, uma vez que o ex-presidente não sabia se compareceria à cerimônia de posse, a presidente encaminhou para sua assinatura o termo de posse e que este só seria utilizado caso fosse confirmada a ausência do ministro.
O Palácio do Planalto disse ainda que repudia com veemência a divulgação dos áudios e afirmou que a ação é uma afronta aos direitos e garantias da presidência da República e que serão adotadas todas as medidas judiciais e administrativas cabíveis.
Procurado pela TV Globo, o Instituto Lula não vai se manifestar.
A assessoria do Supremo Tribunal Federal informou que a ministra Rosa Weber não comentaria o assunto nesta quarta-feira.
O ministro Jaques Wagner condenou o vazamento das conversas e disse que sempre apoiou as investigações, mas que o grampo extrapola os limites e a segurança da presidente. Segundo Wagner, os diálogos estão sendo interpretados fora do contexto para criar fato político negativo. O ministro explicou que, na conversa com Lula, o ex-presidente solicitou que Wagner pedisse para Dilma falar com a ministra Rosa Weber, do STF, mas que ele não teve oportunidade de fazer o pedido.
O Ministério da Fazenda, comandado por Nelson Barbosa, afirmou que a Receita Federal dispõe de instrumentos institucionais, que podem ser acionados por qualquer contribuinte, para apurar eventuais excessos ou desvios de conduta de seus servidores.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, está em viagem à Europa e não foi localizado para comentar.
O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, informou que telefonou para o ex-presidente lula após a condução coercitiva e, em uma conversa completamente informal, fez uma brincadeira com sua a origem popular.
O advogado Luiz Carlos Sigmaringa Seixas esclarece que a conversa entre o ex-presidente da República e um dos seus advogados, por si só, tornaria inviolável sua divulgação, como bem sabe o juiz Sérgio Moro. A divulgação, além de ilegal, reforça que os vazamentos são seletivos e com propósitos eminentemente políticos.