A crise política no Iraque se agravou subitamente, neste sábado, depois que milhares de manifestantes ocuparam o Parlamento por várias horas para protestar contra a incapacidade de a classe política chegar a um acordo sobre um novo governo.
Gritando, cantando e brandindo bandeiras iraquianas, os manifestantes invadiram a Zona Verde no início da tarde. A área é submetida a um forte esquema de segurança por abrigar as principais instituições do país e várias estrangeiras.
Os partidários do influente chefe xiita Moqtada Sadr invadiram o Parlamento, e alguns chegaram a depredar o mobiliário.
“Somos nós que dirigimos este país agora! O tempo da corrupção acabou”, afirmou um manifestante.
“Vocês não vão ficar aqui! Este é seu último dia na Zona Verde”, gritou um outro, dirigindo-se aos parlamentares.
A Polícia permaneceu presente, mas não interveio.
O governo tomou medidas imediatas para reforçar a segurança ao redor da Zona Verde. Situada no centro de Bagdá, a Zona Verde abriga, além do Parlamento, o Palácio presidencial, os gabinetes do premiê e inúmeras embaixadas, entre elas a dos Estados Unidos.
Os manifestantes colocaram arame farpado em uma estrada que leva a uma das saídas do bairro, impedindo alguns parlamentares de fugir.
A ocupação durou cerca de seis horas, quando então deixaram o imóvel, atendendo a pedidos de membros da milícia de Moqtada Sadr, e iniciaram um “sit-in” na praça Ihtifalate na Zona Verde.
Em nota, o primeiro-ministro Haider al-Abadi afirmou que a situação em Bagdá estava “sob controle das forças de segurança”.
Essa escalada das tensões acontece, depois de a capital iraquiana já ter sido colocada em alerta neste fim de semana por temores de atentado.
Neste sábado de manhã, um atentado reivindicado pelo grupo Estado Islâmico (EI) deixou pelo menos 23 mortos e 38 feridos, muitos deles peregrinos xiitas.
Sadr ameaça
Os manifestantes se reuniram pela manhã diante da Zona Verde. Eles decidiram invadir a área ao saber que os deputados não haviam chegado – mais uma vez – a um acordo para a aprovação de um novo governo de tecnocratas proposto pelo primeiro-ministro Haider al-Abadi.
A agitação começou minutos depois de uma entrevista coletiva de imprensa de Moqtada Sadr na cidade santa de Nayaf. O líder condenou o impasse político, mas não pediu a seus partidários que entrassem na Zona Verde.
Os políticos “se recusaram a pôr fim à corrupção e às cotas”, denunciou Sadr, afirmando ainda que nem ele, nem seus partidários participariam de “qualquer processo político, no qual tenha algum tipo de cota para os partidos”.
Há anos, os postos-chave no governo são distribuídos com base em cotas políticas e sectárias, prática essa à qual os manifestantes querem pôr fim.
Xiita que chegou a poder em setembro de 2014, Abadi tenta há semanas fazer o Parlamento aprovar uma equipe de governo composta de tecnocratas. Segundo eles, este gabinete poderia realizar de maneira mais eficaz reformas cruciais de luta contra a corrupção.
Muitos políticos se opõem, porém, com medo de perder seus privilégios.
Na terça, os deputados haviam aprovado uma parte dos candidatos propostos, em uma tumultuada sessão, na qual parlamentares jogaram garrafas na direção do primeiro-ministro.
“O Parlamento e o governo (…) sempre defenderão seus privilégios em detrimento das reformas”, considerou o pesquisador Zaid al-Ali, da Universidade de Princeton, autor de “The Struggle for Iraq’s Future” (“A luta pelo futuro do Iraque”, em tradução livre).
Para ele, o movimento de ira da opinião pública é “totalmente previsível”.
A chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, condenou a invasão ao Parlamento, alertando para uma nova desestabilização do país.
A crise política se soma às dificuldades econômicas ligadas ao impacto da queda dos preços do petróleo.