Uma escritura registra que o senador eleito Flávio Bolsonaro recebeu dois imóveis e mais R$ 600 mil pela venda de um apartamento. O senador eleito disse que parte do sinal dessa compra foi paga em espécie e que depositou esse dinheiro na conta dele, entre junho e julho de 2017. O comprador confirma que pagou cerca de R$ 100 mil em dinheiro vivo. Mas, de acordo com a escritura, o pagamento de R$ 550 mil aconteceu três meses antes das operações consideradas atípicas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Os outros R$ 50 mil foram pagos em agosto, em cheques no ato da escritura.
O apartamento fica no último andar de um prédio em Laranjeiras, na Zona Sul do Rio. O imóvel tem 226 metros quadrados e dependências na cobertura. Flávio Bolsonaro comprou o imóvel na planta junto com a esposa. Pela escritura, a compra foi em dezembro de 2016, no valor de R$ 1,7 milhão.
O documento diz que, em 2017, ele fez uma permuta com Fábio Guerra e a mulher, Giordana Vinagre de Farias Guerra. Deu o imóvel de Laranjeiras pelo valor de R$ 2,4 milhões em troca de um outro apartamento no bairro da Urca, também na Zona Sul do Rio; uma sala de escritório na Barra da Tijuca, na Zona Oeste; e mais R$ 600 mil.
A equipe de reportagem falou com Fábio Guerra por telefone. Ele confirmou o que disse Flávio Bolsonaro, que parte do pagamento foi em dinheiro vivo, e em três ou quatro parcelas.
Produtor: Mas você deu o dinheiro em espécie?
Guerra: Dei. A média foi isso ai. Não posso falar ao certo, porque de repente foi 70, 80, foi 120, 110 [mil reais], entendeu, mas a média foi isso ai mesmo. O resto foi tudo depósito.
A escritura, no entanto, diz que os R$ 600 mil foram pagos da seguinte forma:
- R$ 550 mil a título de sinal, em 24 de março de 2017;
- 5 cheques que somaram R$ 50 mil, em 23 de agosto de 2017.
Flávio Bolsonaro diz que o dinheiro recebido como sinal é o dinheiro que foi depositado na conta dele nos meses de junho e julho, como aparece no relatório do Coaf.
48 depósitos de R$ 2 mil
O documento do Coaf mostrou que foram feitos 48 depósitos em espécie na conta de Flávio, concentrados no autoatendimento da agência bancária que fica dentro da Assembleia Legislativa (Alerj), quando ele era deputado estadual, e sempre no mesmo valor: R$ 2 mil reais.
O total foi de R$ 96 mil depositados em cinco dias. Em 13 de julho de 2017, por exemplo, foram 15 depósitos em 6 minutos.
Nas entrevistas que deu no domingo (20), à Rede Record e à RedeTV, Flávio alega que depositou o dinheiro na conta dele, na Alerj, em 48 envelopes de R$ 2 mil, porque era o local onde ele trabalhava – e que esse valor era o limite para cada depósito no caixa automático.
Flávio Bolsonaro ainda não explicou por que optou por fazer os 48 depósitos de R$ 2 mil com diferença de minutos em cada operação, em vez de depositar a totalidade do que recebeu em espécie de uma vez só na agência bancária onde tem conta.
Agência tem caixas com funcionários
A equipe de reportagem foi até a agência bancária dentro da Alerj. É uma agência que funciona normalmente no horário entre 10h e 16h, que tem caixas automáticos e também caixas com funcionários para atender os clientes.
Nos horários em que foram feitos a maioria dos depósitos do senador eleito no caixa eletrônico, com até 15 envelopes de uma única vez, às 11h, às 12h e às 15h, havia funcionários do banco trabalhando.
O relatório do Coaf também apontou uma outra operação atípica do senador eleito: o pagamento de um título bancário no valor de R$ 1,16 milhão.
Flávio Bolsonaro disse, também nas entrevistas de domingo, que esse pagamento também se refere à permuta que fez com o apartamento que ele comprou na planta. Afirmou que a Caixa Econômica Federal quitou a dívida dele com a construtora, e que ele passou, então, a dever à Caixa.
A escritura confirma que Flávio quitou o empréstimo com a Caixa Econômica em 29 de junho de 2017.
Flávio Bolsonaro disse nas entrevistas que sofre uma perseguição do Ministério Público do Rio (MPRJ) nas investigações sobre movimentações financeiras atípicas de assessores parlamentares da Alerj. A suspeita é que funcionários dos gabinetes devolviam parte dos salários.
Nesta segunda, o procurador-geral de Justiça do Rio, Eduardo Gussem, disse que não houve nenhuma ilegalidade na investigação.
“Se alguém cometeu alguma quebra de sigilo, alguma irregularidade, definitivamente não foi o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro”, disse Gussem, em entrevista coletiva.
O Jornal Nacional procurou a assessoria de Flávio Bolsonaro para saber por que ele fez diversas operações de depósito no caixa eletrõnico, em vez de depositar diretamente no caixa da agência, e também para saber detalhes do pagamento do sinal, mas não teve resposta.